"O Fiel Camareiro" (The Dresser) , 1983 (Inglaterra) Direção: Peter Yates Atores: Albert Finney, Tom Courtenay, Edward Fox, Zena Walker. Duração: 113 min Gênero: Drama
Apesar de ser um filme direcionado à classe artística, principalmente a teatral, ele acaba sendo muito mais do que isso. Ele acaba sendo um genuíno tratado sobre a senilidade. Como pano de fundo, temos o próprio formato das companhias shakespearianas de teatro inglês em seus últimos dias no começo do século passado. Não se faz mais teatro dessa forma, extinguiu-se junto com a Segunda Guerra Mundial - tempo em que ocorre o filme.
"Sir" Donald Wolfit (Albert Finney), que na versão dublada recebeu um singelo e bobo pronome de senhor, apesar de ser o principal ator da companhia shakespeariana, não é o protagonista deste filme. O grande personagem é seu "companheiro" - o trocadilho do qual camareiro também significa em lingua inglesa, mas que não tem a mínima semelhança conotativa no Brasil - que atende pela alcunha de Norman (Courtenay).
O camareiro não é apenas o único amigo do intragável Sir, ele praticamente é a alma da companhia. Essa, que diga-se de passagem, é criada, dirigida e que tem como único ator de verdade nada mais nada menos que o próprio Sir. O grupo percorre a Inglaterra dispensada de servir na Guerra para servir o povo com o que há de melhor. E assim, um dia se está em uma cidade interpretando Otelo e no outro seguinte se está em outra cidade interpretando Rei Lear ou Ricardo III. E, em meio a esta pesadíssima rotina, tão somente o quase-abnegado, mas sem dúvida dedicado Norman sabe o que se deve interpretar e como tratar a estrela e alma da companhia. Norman é ainda massagista, consultor sentimental, analista, e espanta-espertalhona. Enfim, a vida de Norman passa a ser tudo o que houver Sir em seu centro.
O filme é praticamente inteiro rodado entre o camarim e a cochia - exceto pela cena da estação de trem, que é preciso de um estudo inteiro para explicá-lo para quem não viu o filme. Há personagens muito bem construídos, mas é a relação entre Norman e Sir que se é detalhado em um grau de sofisticação imenso - além do espetáculo de interpretação que ambos atores dão (inclusive, ambos indicados ao Oscar). Há ainda inúmeros detalhes da vida no teatro como desejar "merda" e não provocar azar ao pronunciar em voz alta a palavra "Macbe--" (melhor ficarmos na segurança e dizer apenas "Tragédia Escocesa" - senão, vá até lá fora e dê três voltas ao redor de si mesmo).
Enfim, um filme intenso, denso, que transpõe o esforço de interpretação que o teatro exige para a "cochia" do cinema. E com um final que nos faz refletir até quando a abnegação e o egoísmo convivem.
Ósculos e amplexos.
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